sexta-feira, março 20, 2009

Conversando contigo...depois!






Amanhã vou visitar-te...

Vou levar comigo os únicos beijos q ainda te posso dar. Agora escolho-os apenas pela cor - sempre brancos - e pelo aroma...

Quando chego e olho o teu rosto, naquele sorriso preso numa pedra fria, já um pouco gasto pelos raios de um sol que continua a nascer todos os dias, servindo-te de manto, tento sorrir-te também para que saibas que cheguei e que ainda sei sorrir...

Coloco os meus beijos ao lado do teu rosto como se eu própria me aconchegasse no teu colo e sento-me sempre um pouco para conversar contigo.

Deveria talvez rezar quando te vou visitar. Foi assim q me ensinaram a fazer, quando era mais pequena... mas n sou capaz. Preciso de sentir q ainda me ouves. Preciso de conversar contigo!

É por isso que quando me sento e te olho a sorrir, mesmo que pelo meu rosto desçam algumas lágrimas q n consigo evitar, eu sei q me escutas e que sentes o aroma a saudade nos beijos q te dou.

Nessas alturas nem preciso cerrar as pálpebras para voltar aos momentos em que ainda tinhas aquele colo sem igual e me ensinavas a crescer e a conhecer o amor e a ternura.



Um dia disseste-me que quando gostamos muito de alguém nunca o perderemos. Acreditei em ti! Tu dizias-me sempre as verdades, porque me haverias de mentir nesse momento?... Mas quando partiste eu pensei que afinal não era sempre tão verdade o q me dizias. Eu gostava tanto de ti, pai... e tu partias assim! Sem sequer me dares tempo de te dizer adeus...



Hoje quando vou visitar-te sei sempre q afinal era mais uma das tuas verdades!... Sei agora q foi mais uma das formas q encontraste para me ensinar que a vida também doi... mas quando amamos muito alguém nunca deixamos de sentir esse amor. Foi assim q me ensinaste q o amor vale a pena e que a nossa capacidade de amar é maior do q alguma vez imaginámos...

E é por isso que quando te vou visitar ainda converso contigo como se ainda estivesse no teu colo.

E é por isso q quando te vou visitar te levo flores brancas, com o aroma mais doce q encontro... Porque era assim q sentia os beijos q me davas... e são ainda assim os beijos q te deixo, naquela jarra, ao lado do teu rosto...



As saudades... sinto-as cada vez mais intensamente, mas essa é a certeza q tenho q nunca me mentiste... que nunca te perderei... e que, onde quer q estejas, estás sempre comigo, aninhada no teu colo, imenso, bordado de ternura e afagos... e agora com a mãe tb ao pé de ti!



Sabes, poderia passar aqui a noite a agradecer-te todas as coisas que me deste e me ensinaste e acredita q a noite n seria suficiente... mas digo-te apenas um "obrigada": por me teres ensinado a viver sabendo o valor das palavras "verdade" e "amor". Deixaste-me assim a maior herança que uma filha pode herdar - A de te poder recordar-te sempre como um Pai a valer!



Um beijo do tamanho do universo!



Cris ( Conversas contigo... depois!)




terça-feira, março 17, 2009

Um dia aprendi a ler...

Foto: Cristina Fidalgo



Como alguns de vocês sabem, sou professora de Português. Mas tb sabem que quando entro nesta seara, onde as sementes vão crescendo, nem me lembro que o sou. Entro aqui sem estatuto profissional, apenas como alguém para quem as palavras são tesouros! Se hoje me refiro a este pormenor é, apenas, porque gostava de partilhar convosco o que me levou a gostar tanto do que faço... Partilhar o que se gosta é um dos meus princípios de vida. Apenas por isso o faço e, se de entre vós, conseguir que apenas um/a fique a gostar um pouco mais de misturar estes pequenos símbolos, a q se convencionou chamar de letras por forma a criar pequenas e simples palavras, que às vezes dizem coisas tão importantes e tão grandes, então darei por bem empregue o pedacinho de vida que dediquei a este canto e a esta mensagem, em particular!...

Ao longo do meu percurso escolar fui sempre uma aluna muito pouco brilhante a Português. Lia as obras que me impunham apenas por obrigação e somente quando não conseguia encontrar os seus resumos, ou um colega que me desse apontamentos já redigidos. Tudo me parecia insípido e maçador: legados velhos, que outros tantos velhos tinham deixado como herança _ daquelas heranças que, depois de arrumado o sótão, apenas um décimo do seu espaço fica ocupado por algo que minimamente se aproveite.
Não sou, nem nunca fui, materialmente ambiciosa por isso também esta herança pouco me dizia.
A par de tudo isto, nunca um professor de Português me tinha falado da sua disciplina com um pequeno brilho que fosse, no olhar!

Um dia, porém, vi-me na eminência de perder um ano da minha vida, apenas pq não conseguia entrar para o 12º ano se n completasse o 11º... e faltava-me apenas passar a Português!!!!
Contrariada, aceitei a única solução apresentada pelo meu pai e à qual n tinha meios de fugir: Explicações durante o Verão!
Claro que me senti a mais infeliz das criaturas quando imaginei a troca da praia pela casa do explicador, a toalha pelos livros e o mar por um quadro negro. Além de q tudo isto significava um enorme deficit nas minhas horinhas de namoro apaixonado... Mas, como contra factos não adianta argumentar e o meu pai era um doce, mas não admitia "mas", lá fui eu, mais triste que os tristes, num dia lindo de sol e de calor em q até os pobres passarinhos pareciam gozar com a minha cara.
O explicador era um Sr. já idoso, com uma linguagem erudita e tão feio q metia dó!... Mas tão lindo por dentro q dava gosto ouvi-lo!...
Não foi preciso mais do q uma explicação para q a ideia de suplício se esfumasse e em seu lugar nascesse uma grande admiração pela palavra. Aquele homem vibrava quando falava de Almeida Garrett, Eça de Queirós, Aquilino ou Junqueiro e todos os tais velhinhos que afinal começavam a não me parecer tão “chatos” assim...
O professor Jaime Vilar, assim se chamava aquele "artista das palavras", sorria por cada um dos seus poros quando falava, falava como quem respira, e fazia-me sonhar! Em cada obra que me ensinava, embrenhava-me nela como se eu fosse uma das personagens. Eu pousava os meus olhos nas páginas dos livros e entrava nelas de corpo e alma, vivendo cada uma daquelas vidas como se fossem minhas.
Quando acabava a explicação, sentia até pena... consolava-me apenas o facto de ter à minha espera, do outro lado da ria, um outro olhar brilhante e, desta feita, que brilhava por mim...

Chegado o exame, provei àquele homem q tinha valido a pena ter-me ensinado a ler um texto nas linhas e nas entrelinhas e, sobretudo, o ter-me ensinado a ler o q nem nas entrelinhas está...

Quando lemos um pedaço de escrita, não nos basta ler as palavras. Para desfrutarmos verdadeiramente do q está escrito, basta-nos tão-somente tentar imaginar os olhos do seu escritor tentando assim ler-lhe a alma. Na alma, sim, nesse pedacinho de nós e dos outros, que nem sabemos bem onde se encontra, está o princípio, o meio e o fim de qualquer história que nos é narrada, apresente-se ela sob a forma que se apresentar. Se nos limitarmos a juntar as letras e a repetir interiormente as palavras que alguém escreve, perdemos a alma do que nos quis dizer ou até daquilo que nos quis esconder...
Compreendendo tudo isto, eu concluí que me basta um livro ou apenas um lápis e um pedaço de papel para nunca estar só!
Foi nesse momento q resolvi ser professora de Português. Não almejo perfeição... essa só a quero em pequenos momentos, mas ficarei feliz se um dia souber que um aluno meu se apaixonou pelas palavras, como eu me apaixonei... se de alguma forma eu tiver contribuído para que alguém tenha aprendido a não estar só. Alguém cujo olhar emane brilho ou derrame lágrimas ao ler ou escrever o q quer q seja!...

Um beijo aos dois homens q me ensinaram a ler: o meu pai e o prof Jaime Vilar (onde quer q estejam!)


Cris (Do Jardim da Minha Alma)